segunda-feira, 19 de abril de 2010

Capítulo 1

Capítulo 1


Como qualquer garota fui apaixonada pelo garoto mais lindo da escola que não me dava bola e nem mesmo sabia que eu existia. Tive amigas maravilhosas e uma em especial Maria Luiza (somos amigas até os dias de hoje). A água e o vinho, eu geminiada desatenta e sonhadora, ela canceriana moralista e organizada.

Namorei muito, beijei muito e nunca fui ralada nos muros pelos garotos ah ah ah ah.

Meu pai numa alma de militar. Bravo, sisudo, honesto, responsável, o rei da família. Raramente ria (tinha receio de perder o respeito) e quando o fazia nós todos parávamos para vê-lo sorrir. Sou a mais velha de uma família de cinco irmãos.

Eu e minha amiga Maria Luiza planejávamos nos casar no mesmo dia, eu achava que minha mãe havia casado muito velha (23 anos) e queria casar aos 19 e já engravidar (como a vida dá voltas).

Minha amiga casou e fui sua madrinha. Meus amigos em geral se casaram e eu, bem eu conheci o Jorge.

E embora eu ainda sinta muita mágoa essa história não é dele e sim das "marias" que mudaram a minha vida assim como por ironia as mulheres da vida de Jorge mudaram totalmente a vida dele.

Eu curtia meu longo namoro que já durava dez anos com o Jorge, músicos, os eternos sonhadores da arte que fala diretamente ao coração. Ele baterista loiro de olhos azuis, eu a Maria comum, o casal “Peter Pan”, perfeito aos olhos de nossos amigos nunca iríamos amadurecer (nem casar, nem ter filhos... Ai, ai, ai) eu morava com minha família, dormia num quarto dividido com meus quatro irmãos. E apesar de pouco espaço lá estavam espalhadas minhas revistas, partituras, letras de música, cds, dvds (na verdade eram LPs e Fita Cassete ah ah ah) e muitos livros. Assunto de amantes só nos motéis. Adoro fazer hora na cama, e numa casa povoada é impossível curtir momentos de solidão. Adoraria poder ficar de pijamas até a hora que me desse na telha, mas, eu tinha que trabalhar. Entrar no chuveiro sem ninguém bater à porta um verdadeiro milagre.

Meu relacionamento com o Jorge? Classifico que éramos um casal liberal, não tínhamos ciúmes, palavra que procurávamos manter distante de nossos sentimentos. Mas, mulher é um bicho danado de terrível, sei lá, esse tal sexto sentido e esse lance de sangrar cinco dias por mês e não morrer deve nos dar um certo poder... Um faro, não sei o nome certo para esse “clic” que ascende quando algo está estranho, quando algo entra em curto. Chamo de mágica.

Pobres homens, se nem mesmo nós entendemos quem dirá eles... Ah ah ah!

O ponto é que o meu Jorge estava distante, chegava em casa e se estatelava no sofá, o namoro diante da TV começou a ser muito frequente ao menos para nós que nunca curtimos TV, meu morcegão estava mudando, algo estava acontecendo, claro que eu perguntava, sondava, mas ele me dizia que estava tudo bem.

Tudo bem uma ova, algo estava estranho, mas o que?

Dizem que o diabo mora nos detalhes e sei muito quanto a isso, sei identificar num gesto, num olhar, numa respiração, num cacoete os chamados sinais. Mas, até então as dúvidas moravam apenas na minha cabeça.


Foi quando fui visitar uma grande amiga com essa tormenta me corroendo as entranhas, falamos de tudo e de nada como sempre e no meio da algazarra de nossas conversas e gargalhadas desconexas vomitei:

- O Jorge está apaixonado por alguém.

Silêncio.

Tolas mulheres, tolas criaturas...

Caí no choro. Transformar um sentimento em palavra se torna algo tão grande, tão verdadeiro, por isso não entendo como pessoas podem dizer “te amo” como se dissessem “estou com fome”.

O que sai da boca se torna concreto, monumental, poderoso. Quando alguém ouve o que dizemos é como se o som de nossa voz contendo nossos segredos se propagasse e explodisse em mil partículas indo se alojar na mente do ouvinte e de lá se sabe Deus para onde vão, talvez se alojem no coração ou ficam na mente martelando num constante, isso até que essas informações novamente se transformem em palavras – muitas vezes adulteradas, pois nelas agora contém um pouco da outra pessoa, de seu raciocínio, sentimento, julgamento e de seu veneno – a verdade é que lá estava o meu medo, a minha angústia dando voltas no ar e minha amiga parecia ter engolido a seco o que eu havia dito, pois permaneceu ali de boca aberta no que pareceu uma eternidade, se levantou e me abraçou.

- Como assim Maria?

- Sei lá, é uma impressão, uma dor, um aviso. Algo mudou. Ou ele deixou de gostar de mim ou, sei lá, está a fim de alguém.

- Então são apenas conjecturas?

- Eu sei o que falo. Algo está errado. Algo nele está diferente, sua fisionomia sempre tão branda se modificou e não é problema de gases.

Rimos.

- Já sei, você está de TPM – Arriscou Maria da Glória.

- Não. E hoje nem é segunda-feira.

PAUSA: Isso é muito importante, eu não gosto de segundas, são medonhas, enfadonhas, neuróticas e agourentas, realmente detesto as segundas, o mundo vive com medo da tal sexta-feira 13 porque nunca se deram conta que vários problemas e desencontros acontecem exatamente numa segunda-feira (FIM DA PAUSA).

Não demorou muito e lá estava o Jorge me chamando, havia ido me buscar. Suspirei, joguei a dor para dentro e saí como se nada houvesse acontecido, eu era muito boa nisso e normalmente me ajudava muito. Hoje? É outra história.

Depois desse dia de desabafo com minha amiga Maria da Glória, destravou o raio da tramela da minha língua e passei a falar para quase todas minhas amigas. Já tinha uma legião de odiadoras da dita cuja sem nome que acabara de mudar para a minha mente tão calidamente fértil, mas, homens são homens e ponto final, de uma forma ou de outra acabam se traindo.

Os dias passaram e fui notando um nome novo nos comentários do Jorge.

Maria Angélica!

Alerta geral!

Cada situação parecia lembrar uma tal fulana, mas, uma fulana que eu nunca ouvira falar, em dez anos dá para conhecer até um estádio de futebol repleto de amigos e ex-namoradas. Ali naquele nome morava o perigo.

Antenas ligadas, sentidos aguçados, garras afiadas, dentes prontos a triturar... Credo! Já estava me sentindo uma lutadora de sumô... Ah ah ah.

- A Maria Angélica falou. - Porrada na cara.

- Essa música lembra que a Maria Angélica...

Puxão de cabelo. Mordida na orelha.

Acho que meu olhar disse tudo isso junto. Nossos olhos se encontraram.

- Maria preciso lhe falar sobre a Maria Angélica.

Fui a nocaute!

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